Blog “Dependência e
Co-dependência Química”, de autoria de Superdotado Álaze Gabriel. Disponível em
http://dependenciaecodependenciaquimica.blogspot.com.br/
DEPENDÊNCIA QUÍMICA
A Dependência Química é um conjunto
de fenômenos que envolvem o comportamento, a cognição e a fisiologia corporal
conseqüente ao consumo repetido de uma substância psicoativa, associado ao forte
desejo de usar esta substância, juntamente com dificuldade em controlar sua
utilização persistente apesar das suas conseqüências danosas. Na dependência
geralmente há prioridade ao uso da droga em detrimento de outras atividades e
obrigações sócio-ocupacionais.
A tolerância é o primeiro critério relacionado à
dependência. Tolerância é a necessidade de crescentes quantidades da substância
para se atingir o efeito desejado ou, quando não se aumenta a dose, é entendida
também como um efeito acentuadamente diminuído com o uso continuado da mesma
quantidade da substância. O grau em que a tolerância se desenvolve varia
imensamente entre as substâncias.
Existe um padrão de uso repetido da
substância que geralmente resulta em tolerância, abstinência e comportamento
compulsivo de consumo da droga. Um diagnóstico de Dependência de Substância
pode ser aplicado a qualquer classe de substâncias. Os sintomas de dependência
são similares entre as várias substâncias, variando na quantidade e gravidade
de tais sintomas entre uma e outra droga. Os sintomas psíquicos e sociais
decorrentes da dependência do fumo, por exemplo, são absolutamente menores do
que aqueles da dependência ao álcool.
Chama-se "fissura" o forte impulso
subjetivo ou compulsão incontrolável para usar a substância. Embora não seja
especificamente relacionada como um critério, a “fissura” tende a ser
experimentada pela maioria dos indivíduos com Dependência de Substância (se não
por todos). A dependência é definida como um agrupamento de três ou mais dos sintomas
relacionados adiante, ocorrendo a qualquer momento, no mesmo período de 12
meses.
Os indivíduos com uso pesado de opióides e
estimulantes podem desenvolver níveis gravíssimos de tolerância, por exemplo,
como se necessitasse dez vezes mais quantidade depois de algum tempo.
Freqüentemente essas dosagens da tolerância seriam letais para uma pessoa
não-usuária. Muitos fumantes consomem mais de 20 cigarros por dia, uma
quantidade que teria produzido sintomas de toxicidade para uma pessoa que está
começando a fumar.
Os indivíduos com uso pesado de maconha em geral
não têm consciência de que desenvolveram tolerância, embora esta tenha sido
largamente demonstrada em estudos com animais e em alguns indivíduos. A
tolerância pode ser difícil de determinar com base apenas na estória oferecida
pela pessoa, porém, os testes laboratoriais acabam mostrando altos níveis
sangüíneos daquela substância, juntamente com poucas evidências de intoxicação,
o que sugere fortemente uma provável tolerância.
Critérios para
Dependência de Substância
|
Um padrão mal-adaptado de uso de substância,
levando a prejuízo ou sofrimento clinicamente significativo, manifestado por
três (ou mais) dos seguintes critérios, ocorrendo a qualquer momento no mesmo
período de 12 meses:
(1) tolerância, definida por qualquer um dos
seguintes aspectos:
(a) necessidade de quantidades progressivamente
maiores da substância para adquirir a intoxicação ou efeito desejado;
(b) acentuada redução do efeito com o uso
continuado da mesma quantidade de substância;
(2) abstinência, manifestada por qualquer dos
seguintes aspectos:
(a) síndrome de abstinência característica para a
substância;
(b) a substância (ou outra estreitamente
relacionada a ela) é consumida para aliviar ou evitar sintomas de abstinência;
(3) a substância é freqüentemente consumida em
maiores quantidades ou por um período mais longo do que o pretendido;
(4) existe um desejo persistente ou esforços
mal-sucedidos no sentido de reduzir ou controlar o uso da substância;
(5) muito tempo é gasto em atividades necessárias
para a obtenção da substância (por ex., consultas a múltiplos médicos ou
fazer longas viagens de automóvel), na utilização da substância (por ex.,
fumar em grupo) ou na recuperação de seus efeitos;
(6) importantes atividades sociais, ocupacionais
ou recreativas são abandonadas ou reduzidas em virtude do uso da substância;
(7) o uso da substância continua, apesar da
consciência de ter um problema físico ou psicológico persistente ou
recorrente que tende a ser causado ou exacerbado pela substância (por ex.,
uso atual de cocaína, embora o indivíduo reconheça que sua depressão é
induzida por ela, ou consumo continuado de bebidas alcoólicas, embora o
indivíduo reconheça que uma úlcera piorou pelo consumo do álcool).
|
O dependente pode até expressar um desejo
persistente de reduzir ou regular o uso da substância, mas reluta sempre em
decidir deixar de vez a substância. E com freqüência já deve ter havido muitas
tentativas frustradas de diminuir ou interromper o uso. A questão essencial, de
fato, está no fracasso do dependente se abster de usar a substância, apesar das
evidências do mal que ela vem causando.
Em geral o dependente dedica muito tempo obtendo a
substância, usando-a ou recuperando-se de seus efeitos. Em alguns casos de
Dependência de Substância, virtualmente todas as atividades da pessoa giram em
torno da substância.
As atividades sociais, ocupacionais ou recreativas
podem ser seriamente prejudicadas, abandonadas ou reduzidas em virtude da
dependência ou uso bastante abusivo da substância, e o dependente pode
afastar-se de atividades familiares a fim de usar a droga em segredo ou para
passar mais tempo com amigos usuários da substância.
As primeiras experiências com drogas ocorrem,
freqüentemente, na adolescência. Vários trabalhos, incluindo a Organização
Mundial de Saúde (OMS) têm evidenciado a precocidade da faixa etária do
início do uso de drogas, geralmente dentro da adolescência, entre 10 e 19 anos.
Fisiologicamente, na adolescência as regras
costumam ser questionadas e contestadas e, juntando-se o fato desta ser uma
época de experimentações, surge um risco maior para o uso de drogas ilícitas,
álcool e fumo. Todavia, felizmente, nem todas as pessoas que experimentam
drogas se tornam dependentes, porém, quando ocorre, a dependência química é uma
doença complexa, de tratamento longo e nem sempre eficaz.
Quando se pesquisam as causas para a dependência
química é acaba-se sempre concluindo ser esta multideterminada, ou seja,
multifatorial. Existem alguns fatores fortemente associados ao uso abusivo de
drogas e dependência química, como por exemplo, os fatores genéticos,
psicológicos, familiares e sociais. Em geral parece que esses fatores não
costumam agir isoladamente e sim em conjunto.
CAUSAS EXISTENCIAIS
ATRIBUÍDAS AO USO DE DROGAS
Aqui vamos comentar algumas influências
sócio-ambientais no uso de drogas, ou seja, nas influências do destino
vivencial da pessoa sobre seu comportamento, pensamento e sentimento.
Família – Dentre os inúmeros fatores associados à
dependência química, a família, ou, mais precisamente, as atitudes da família
com propósitos educativos parece ser um fortíssimo fator de intervenção e
influência, principalmente em relação à prevenção da dependência. Dessa
maneira, o meio familiar pode ser um importante elemento de proteção ou, ao
contrário, de facilitação dos comportamentos de risco, do abuso ou de uma
possível dependência de drogas.
Segundo Pons (1998), os principais fatores
familiares de proteção ao uso de drogas se encontram nos laços afetivos
estabelecidos entre seus membros, no monitoramento das atividades e amizades do
adolescente, na construção de escalas de valores éticos e no estímulo para
condutas sociais adequadas.
Rebolledo, Ortega e Pillon (2004, citado por Broeker e
Jou, 2007) analisaram 2.829 estudantes de ambos os sexos, com idades entre
12 e 17 anos, mediante o Test Drug Use Screening Inventory. Os autores
constataram que a disfunção familiar e a existência de transtorno emocional
prévio foram os fatores mais correlacionados ao maior risco para o uso de
drogas.
Alguns outros pesquisadores (Pechansky, Szobot e
Scivoletto, igualmente citados por Broeker e Jou, 2007) atribuíram à
ausência do pai no domicílio do adolescente um risco 22 vezes maior chance de o
adolescente ser dependente de drogas, quando comparado aos adolescentes que
viviam com ambos os pais.
Sem nenhuma dúvida reconhece-se universalmente que
o papel dos pais e do ambiente familiar é marcante no desenvolvimento dos filhos.
A falta de suporte e estrutura familiar, bem como o comportamento de risco ou o
uso de drogas pelos próprios pais são atitudes facilitadoras ao uso, abuso e
dependência dos filhos.
Acredita-se, inclusive, haver uma relação entre o
aumento no consumo de drogas e as mudanças sofridas pela estrutura familiar na
modernidade. A entrada das mulheres para o mercado de trabalho e,
conseqüentemente, a ausência proporcional de sua presença no lar sem dúvida
acabou por conferir um novo perfil à família. Com isso pode ter havido uma
crescente dificuldade no acompanhamento intensivo e na educação dos filhos.
Consumada essa nova estrutura familiar, juntamente
com o grande e crescente número de separações conjugais, automaticamente
inviabilizaram-se os modelos educativos das gerações passadas e novos modelos
deverão ser aplicados. Como tudo o que é novo, diante do novo modelo
educacional, onde participa cada vez mais as instituições e cada vez menos os
pais, existe uma grande apreensão e insegurança sobre quais são, exatamente, as
práticas educativas mais desejáveis.
Seriam consideradas práticas educativas desejáveis
a sensibilidade para os sentimentos dos filhos, o envolvimento positivo nas
atividades dos membros da família, o controle positivo da disciplina conscientizando
o objetivo das regras e divisão da tomada de decisões. Seriam
consideradas práticas educativas indesejáveis a intromissão, o controle do
comportamento através da culpa e da disciplina através da autoridade, a
evitacão de participação nas decisões.
Evidentemente qualquer pesquisador de bom senso
entenderá que a questão pais separados ou não, mãe trabalhando fora ou não,
etc., etc., não pode ter um valor absoluto no modo de agir dos filhos. Em
medicina a relação causal exige uma observância mais criteriosa. Se a questão
fosse tão simples assim, todas as crianças criadas em instituições e orfanatos
seriam dependentes químicos, sociopatas, prostitutas, marginais e assim por
diante.
Modelo Cultural – Outro fator existencial que pode
contribuir para a busca por drogas está no modelo cultural. A cultura, através
da mídia fortemente penetrante no pensamento do ser humano contemporâneo,
influi sobremaneira na elaboração de escalas de valores.
A imagem propalada de usuários de drogas como
pessoas interessantes, glamorosas, bem sucedidas sexualmente, artistas famosos,
algumas vezes com destaque social e/ou econômico seguramente influi nos
conceitos de certo-errado do jovem em formação.
O apelo para beber é absolutamente inegável em
nossa sociedade ocidental. Não se vê, socialmente, uma pessoa convidando a
outra para “ir lá em casa tomar um chazinho”, ou para comemorar algum
sucesso em uma confeitaria. Entre os jovens, causa muita estranheza a pessoa
recusar um copo de bebida alcoólica alegando simplesmente “eu não bebo”.
Possivelmente sua imagem ficará algo arranhada, principalmente para o sexo
oposto.
Também não se vê durante uma noitada de
entretenimento, de forma alguma, um jovem alertando o outro sobre os riscos da
dependência química. Muito pelo contrário; qualquer atitude normativa e de
aconselhamento nesse sentido é pejorativamente tida como inadequada, retrógrada
e aborrecedora.
Alguns ídolos do mundo artístico mortos por
overdose de alguma droga acabam sendo até enaltecidos. São vários os filmes
sobre biografias de grandes drogados, alguns com fortes traços sociopáticos,
apresentando-os como pessoas interessantíssimas, fascinantes e
meritosas.
O valor e mérito social da pessoa na sociedade
contemporânea parece estarem atrelados quase exclusivamente à sua condição de
produção. O uso de drogas pode ser bastante tolerado se a pessoa for um bom
aluno, um trabalhador regular, bem sucedido economicamente, enfim, se for
alguém que convencionalmente se define como “uma pessoa de sucesso”. Mas
não devemos esquecer que sendo “uma pessoa de sucesso” seu comportamento
servirá como modelo para outras tantas pessoas, não necessariamente “de
sucesso”.
A Pessoa – Agora vem uma questão capaz de arruinar qualquer
raciocínio conclusivo aplicado às anteriores; a responsabilidade da pessoa em
seu próprio destino. Não se desmerece, de forma alguma, a importância da
família e da sociedade no desenvolvimento e no desígnio da pessoa, entretanto,
a parte mais importante desse vir-a-ser continua sempre sendo ela mesma.
Juntamente com as pesquisas investigativas sobre a
causalidade da dependência, devem-se enfatizar as pesquisas sobre a
personalidade pré-mórbida do dependente, sobre seu histórico emocional, seus
antecedentes psicopatológicos, sobre sua natureza genética, enfim, as pesquisas
devem valorizar o dependente com o mesmo entusiasmo que valoriza o meio.
Como recomenda muito bem o existencialismo,
didaticamente exposto em Sartre, de fato a pessoa não deve ser responsabilizada
pelo que o destino fez com ela, mas é totalmente responsável pelo que ela vai
fazer com aquilo que o destino fez com ela (veja mais sobre Dependência e Personalidade).
DADOS SOBRE O USO DE
DROGAS ENTRE ADOLESCENTES NO BRASIL
Os adolescentes usuários e dependentes de drogas
têm uma situação vivencial que pode ser comparada aos não dependentes da
seguinte maneira:
Adolescentes Dependentes e Não
Dependentes
|
|
Dependentes Químicos
|
%
|
Não está estudando
|
70,8%
|
Freqüentavam escolas públicas
|
79,2%
|
Repetência de ano pelo menos 1 vez
|
87,5%
|
Têm pais separados
|
79,2%
|
Não Dependentes
|
%
|
Estão estudando
|
87,5%
|
Freqüentam escolas particulares
|
79,2%
|
Não têm repetência
|
29,2%
|
Têm pais casados
|
62,5%
|
Broecker & Jou, 2007
|
Droga usada por adolescentes
Dependentes e Não Dependentes
|
||
Droga
|
Depende
|
Não Depende
|
Maconha
|
96,0%
|
33,3%
|
Craque
|
79,2%
|
8,40%
|
Cocaína
|
50,0%
|
16,7%
|
Cola
|
41,7%
|
8,40%
|
Solventes
|
4,2%
|
12,5%
|
Broecker & Jou, 2007
|
PERCEPÇÃO DA PESSOA
SOBRE SUA PRÓPRIA DEPENDÊNCIA
Quanto, exatamente, o dependente químico reconhece
sua própria dependência? A autopercepção com relação à drogadição é alta, pois,
respondendo questionários anônimos com franqueza, 87,5% dos dependentes
reconhecem ser dependentes químicos e admitem precisar de ajuda, e 89,4% dos
sem-dependência disse não ter problemas em relação ao uso de drogas ilícitas.
Talvez o fato comum dos dependentes externarem um
discurso de não reconhecem ostensivamente sua própria dependência seja um
mecanismo de defesa de pseudo-negação da angustiante penúria existencial em que
se encontram.
Entre os adolescentes brasileiros o consumo de
drogas tem sido pesquisado por vários autores, havendo alguma discrepância bem
pouco significativa entre os resultados. Em relação as drogas mais consumidas
os resultados de Tavares, Béria e Silva Lima são os seguintes:
Substâncias mais consumidas
|
Freqüente
|
Predomínio
|
|
Álcool
|
86,8%
|
24,2%
|
Meninos
|
Maconha
|
19,9%
|
4,9%
|
Meninos
|
Solventes
|
18,2%
|
2,5%
|
Meninos
|
Anfetamínicos
|
8,4%
|
2,3%
|
Meninas
|
Tabaco
|
41,0%
|
28,0%
|
Meninas
|
Cocaína
|
3,2%
|
2,3%
|
Meninos
|
Beatriz Franck Tavares, Jorge Umberto Béria e
Maurício Silva de Lima - Rev Saúde Pública 2001;35(2):150-158 (2.410
estudantes entrevistados)
|
O uso freqüente e intoxicações por álcool foram
mais prevalentes entre os meninos. Há a associação positiva entre uso de drogas
(exceto álcool e tabaco) e:
• Turno escolar noturno;
• Maior número de faltas à escola;
• Maior número de reprovações escolares.
Embora sejam países com realidades muito
diferentes, a comparação entre Brasil e Estados Unidos é válida, tendo em mente
que em nosso país a sociedade tem uma tendência inexorável de arremedar
costumes e comportamento dos americanos. O levantamento domiciliar
realizado pelo CEBRID buscou em todos os detalhes acompanhar o
dos americanos, o que torna a análise de ambos interessantes. Os dados do
estudo americano foram retirados do SAMSHA, 2001, referindo à pesquisa feita em
2000.
Comparação
dos resultados do Brasil e EUA para o uso das diversas drogas psicotrópicas.
|
||
DROGAS
|
Uso na
vida
|
|
Brasil %
|
EUA%
|
|
Qualquer Droga*
|
19,4
|
38,9
|
Maconha
|
6,9
|
34,2
|
Cocaína
|
2,3
|
11,2
|
Crack
|
0,4
|
2,4
|
Heroína
|
0,1
|
1,2
|
Alucinógenos
|
0,6
|
11,7
|
Solventes
|
5,8
|
7,5
|
Opiáceos
|
1,4
|
8,6
|
Tranqüilizantes
|
3,3
|
5,8
|
Estimulantes
|
1,5
|
6,6
|
Álcool
|
68,7
|
81,0
|
Tabaco
|
41,1
|
70,5
|
* - exceto álcool e tabaco
CEBRID – disponível em
http://www.cebrid.epm.br/levantamento_brasil/parte_5.pdf
|
CONSUMO DE MACONHA NO
BRASIL
Estudo feito pelo CEBRID abrangendo 107
cidades com mais de 200 mil habitantes sobre o consumo de maconha no Brasil.
Exceto tabaco e álcool, o uso na vida, no total das drogas foi de 19,4%, sendo
a maconha a droga que teve maior uso experimental com 6,9%. A região Sul do
Brasil foi à campeã em porcentagens de uso na vida para a maconha com 8,4% de
usuários.
A dependência de maconha ,ao contrário
do que sempre se divulgou com duvidosa intenção, existe sim e apareceu em 1,0%
dos entrevistados, o que equivale a uma população estimada de 451.000 pessoas
no país. Este é provavelmente um número muito otimista, considerando as
dificuldades em se obter respostas sinceras. A região Sul foi aquela onde
apareceram as porcentagens mais expressivas de dependentes de maconha 1,6% dos
entrevistados.
Prevalência (uso na vida) de maconha
e cocaína
|
||
Maconha*
|
Cocaína**
|
|
EUA
|
34,2%
|
11,2%
|
Reino Unido
|
25,0%
|
3,0%
|
Dinamarca
|
24,3%
|
1,7%
|
Espanha
|
19,8%
|
3,2%
|
Chile
|
19,7%
|
4,5%
|
Holanda
|
19,1%
|
2,6%
|
Grécia
|
13,1%
|
1,0%
|
Suécia
|
13,0%
|
1,0%
|
Brasil
|
6,9%
|
2,3%
|
Colômbia
|
5,4%
|
1,6%
|
Alemanha
|
4,2%
|
0,2%
|
Itália
|
3,5%
|
|
Portugal
|
1,3%
|
|
*- CEBRID
** - Ospina,1997; CONACE, 2001, 2005; EMCDDA,
2005; NIDA, 2005; CICAD, 2005
|
Poucos países separaram o uso de crack da cocaína.
No Brasil o uso na vida de crack foi de 0,7%, no Chile é de 1,4% e nos Estados
Unidos 2,6% (CONACE, 2005; NIDA, 2005). As regiões com maiores porcentagens de
uso de crack no Brasil foram a região Sul com 1,1% e a Sudeste com 0,8%. A
capital com maior uso na vida de crack foi João Pessoa com 2,5% dos estudantes.
Nos EUA houve um aumento significativo de usuários
nocivos e dependentes de maconha entre os anos de 1992 e 2002 (30,2% e 35,6% de
usuários, respectivamente). Este aumento pode estar relacionado, em parte, ao
aumento do potencial de dependência da maconha. Isso talvez seja conseqüência
do amento de 66% no teor da substância ativa da maconha (chamada de THC)
nesse período. Com técnicas sofisticadas de apuração da planta o THC na
amostra de maconha analisada em 1992 era de 3,01%, contra 5,11% da maconha
analisada em 2002.
Em um estudo prospectivo, iniciado em 1970, com
acompanhamento por 12 anos, mostrou-se que 1 em cada 4 usuários de maconha
desenvolveram síndrome de dependência no período compreendido entre a
adolescência e a idade adulta jovem.
AUMENTO DO CONSUMO DE
MACONHA NO BRASIL
Dados do CEBRID em 10 capitais, onde foram
realizados levantamentos anteriores entre estudantes, pode-se notar que a
tendência par o uso na vida (pelo menos uma vez na vida) foi aumentar em oito
capitais, exceto em Brasília e Salvador. O uso de maconha nos quatro
levantamentos realizados pelo CEBRID, entre estudantes do ensino
fundamental e médio, de dez capitais brasileiras (1987, 1989, 1993, 1997 e
2004) passou de 2,6 em 1987 para 6,5 % em 2004.
Uso de maconha
entre meninos de rua em 4 capitais
|
||
Capitais
|
1987
|
2003
|
São Paulo
|
43,7%
|
73,8%
|
Rio de Janeiro
|
20,0%
|
59,3%
|
Brasília
|
21,9%
|
52,3%
|
Porto Alegre
|
29,3%
|
21,3%
|
A maconha é a substância ilícita mais consumida nas
sociedades ocidentais. Três questões referentes ao consumo de maconha são discutidas
atualmente:
• O início do consumo cada vez mais precoce na
adolescência;
• A potência cada vez maior das novas
apresentações de canabis; e
• O aumento progressivo da prevalência do uso.
A Dependência Química é um dos
transtornos mentais mais comuns, acometendo as mais diversas faixas etárias,
porém, mais comumente iniciado na adolescência e juventude. Consumir drogas é
uma prática milenar e universal e não há sociedade que não conheça algum tipo
de droga com as mais diversas finalidades.
A adolescência é uma etapa do desenvolvimento que
suscita grandes preocupações quanto ao consumo de drogas, principalmente por
conta da vulnerabilidade à todo tipo de influência e frustrações. As
causas da dependência aparentemente são múltiplas, desde genéticas,
culturais, até vivenciais, o tratamento é dificílimo e o prejuízo na vida
pessoal do dependente é incalculável.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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KUPEK E, PIRES M. Prevalência
e fatores de risco relacionados ao uso de drogas entre adolescentes. Revista de
Saúde Pública, 36(1), 40-46 (2002).
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C. Z.; JOU, G. I. Práticas
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CENTRO
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CONACE. Consejo Nacional para el Control
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TAVARES
BF, BÉRIA JH, SILVA DE LIMA M. Prevalência do uso de drogas e desempenho escolar
entre adolescentes. Revista de Saúde Pública;35(2):150-158 (2001).
DEPENDÊNCIA
QUÍMICA E OUTRAS DOENÇAS MENTAIS
Uma
das perguntas mais comuns sobre dependência química é saber, afinal, se os
usuários de drogas são mais vulneráveis às doenças mentais ou se algumas
doenças mentais é que levam ao consumo da droga? Excluindo-se o próprio fato da
dependência, que já é uma doença, a pergunta que se faz é saber se a pessoa que
continua usando drogas apesar de saber todo mal que ela causou e causa em sua
vida é normal psiquiatricamente.
Conforme afirma o DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico
de Transtornos Mentais da Associação Norte-americana de Psiquiatria) o Transtorno
por Uso de Substâncias, que engloba o abuso e a dependência a
substâncias, encontra-se freqüentemente associado a outras patologias
psiquiátricas. Assim diante de um paciente com uso problemático de drogas, seja
dependência ou uso abusivo, devemos sempre investigar a existência de outra
doença emocional; ou por baixo da dependência ou como conseqüência.
É provável até que a existência de outros transtornos emocionais
co-mórbidos à dependência dificulte a adesão do paciente ao tratamento,
proporcione resultados piores em termos de freqüência e quantidade da droga
consumida, bem como do funcionamento psicossocial. É isso mesmo. Nem sempre é a
droga em si a responsável exclusiva pela apatia ocupacional do dependente,
pelos fracassos sociais e familiares. Muitas vezes sua própria personalidade se
mostra algo inviável para a condução da vida.
São muitas as dúvidas sobre as causas, conseqüências e recusa ao
tratamento da dependência. Seriam outros transtornos emocionais que causariam
isso tudo? Quais patologias mentais estariam mais freqüentemente associadas ao
uso de drogas? Tais doenças teriam uma evolução diferente por culpa das drogas?
Quais os tratamentos e as prevenções mais apropriadas?
Muitos trabalhos de pesquisa têm mostrado uma elevada prevalência
(13%) da associação de doença mental com uso abusivo de substâncias. Nas
populações em tratamento psiquiátrico, tanto ambulatorial quanto em internação
hospitalar, encontra-se 20 a 50% de co-morbidade entre as variadas doenças
mentais com o alcoolismo e abuso de outras drogas (McCrady, 1999).
Observações inversas também ocorrem, pois nos centros especializados
no atendimento ao dependente químico a co-morbidade com outros transtornos
mentais também é maior, se comparada à população em geral. Em relação às
doenças mentais mais severas, como são a esquizofrenia e o transtorno bipolar
do humor, em quase metade dos pacientes também aparece a associação com abuso
ou dependência de substâncias psicoativas (Alverson, 2000).
Embora não haja evidências na literatura de determinados transtornos
emocionais e de personalidade como sendo causas do comportamento aditivo, a
presença de Transtorno de Conduta na infância, de diagnóstico
de Transtorno Afetivo Bipolar na adolescência e Transtorno Anti-Social de Personalidade ou Borderline seriam fortes fatores de risco para uso
de drogas no futuro (Glantz, 2000).
Não obstante, há evidencias de que a desinibição de comportamento e
o temperamento considerado "difícil" na criança possam
representar fatores de risco para o uso futuro de drogas (idem). Em outras
palavras, embora sem critérios suficientes para se constituir em relação
causa-efeito, as observações mostram sugestiva associação de determinadas
patologias mentais e traços de personalidade com o uso de drogas.
Uma das hipóteses que tentam justificar a associação entre
dependência química e transtornos emocionais seria uma espécie de
vulnerabilidade da pessoa para a doença mental. Neste caso a droga apenas
desencadearia e agravaria os sintomas mentais dormentes.
O segundo modelo sugere que essa associação se dá em função da
pessoa que se sente mal por conta de algum transtorno emocional buscar a droga
como uma espécie de “automedicação”. Ela aliviaria os sintomas de sua
depressão, sua ansiedade, obsessão, angústia e assim por diante.
A terceira hipótese supõe uma causa (biológica?) comum que
predisporia o sujeito ao uso de drogas e à doença mental simultaneamente. Um
quarto e último modelo entende a associação droga-doença mental como a
ocorrência independente das duas coisas, apenas uma concomitância. Nesse caso o
uso de drogas pela pessoa com doença mental seria determinado por fatores
independentes daqueles da doença mental (Serge, 2001).
Esses quatro modelos podem ser usados para tentar explicar, por
exemplo, a associação de uma pessoa com transtorno afetivo bipolar e
dependência à cocaína, ou do transtorno obsessivo-compulsivo com o álcool, o
transtorno de ansiedade, fóbico ou do pânico com maconha e assim por diante. É,
inclusive, útil para entender o severo agravamento da tendência esquizofrênica
(personalidade esquizóide, por exemplo) com abuso de craque ou coisa que o
valha.
Já é muitíssimo conhecido das pessoas que lidam com pacientes
internados o fato da maioria dos esquizofrênicos fumarem exageradamente,
sugerindo algum substrato neurobiológico comum aos dois estados. Os pacientes
esquizofrênicos que fazem uso de tabaco, iniciam seu uso exagerado em
aproximadamente antes do inicio dos sintomas psicóticos em 86% dos casos (Beratis,
2001).
Segundo Moreira e Soares (2003), no caso da esquizofrenia e
o tabaco, os achados neurobiológicos da esquizofrenia envolvem alterações em
circuitos cortico-mesolímbicos associados tanto aos sintomas cognitivos,
perceptuais e afetivos da doença, quanto ao comportamento de recompensa e
fissura do tabaco, o que fortalece a hipótese de uma mesma causa para os dois
estados.
Tecnicamente, a literatura científica vem estabelecendo o sistema
dopaminérgico mesolímbico como o principal substrato biológico para o reforço
positivo de psicoestimulantes, maconha, nicotina e álcool. Essas substâncias
direta ou indiretamente aumentam a liberação de dopamina, um neurotransmissor,
nos sistemas que envolvem os neurônios de uma determinada área cerebral (a área
tegmentar ventral na sua conexão com o núcleo acumbens). Essas mesmas áreas
cerebrais (mesolímbicas) estão envolvidas no comportamento de fissura pela
droga (Chambers, 2001).
É interessante saber que esse mesmo sistema cerebral (mesolímbico)
esta relacionado com os sintomas esquizofrênicos, com a ação dos medicamentos
para esquizofrenia e com o desenvolvimento de sintomas psicóticos pelo uso de
anfetaminas e cocaína, como é o caso da chamada “nóia” (sintomas francamente
paranóicos).
O tratamento do dependente químico portador também de outra doença
mental tem resultados melhores quando se integra o tratamento dos sintomas
psíquicos do eventual transtorno com atitudes direcionadas à dependência. A
existência de comorbidade aumenta a dificuldade no controle de cada doença
isoladamente, ou seja, é mais difícil tratar um paciente deprimido e dependente
de cocaína do que o tratamento da depressão ou dependência à cocaína
isoladamente.
Tem sido comum a comorbidade de Transtorno Depressivo com
uso diário de bebida alcoólica, com dependência ou não. Na maioria dos casos
percebe-se claramente que o álcool está sendo usado como lenitivo da angústia,
desânimo e tristeza próprios da depressão. Neste caso o sucesso terapêutico
será inegavelmente maior se a depressão for tratada com mesmo entusiasmo que a
abstinência do álcool. É bastante freqüente a associação de alcoolismo,
dependência de cocaína ou anfetaminas com depressão. Não se pode tratar uma
doença sem tratar igualmente a outra.
O quadro de Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade
(TDAH), anteriormente acreditado afetar apenas crianças, é
bastante associado ao consumo de cocaína. Os pacientes referem sentir-se
aliviados com a cocaína. A semelhança neuroquímica entre esses dois estados
deduz-se até pelo fato do tratamento do TDAH ser através de fortes estimulantes,
como, por exemplo, o metilfenidato. Neste caso o tratamento precoce do TDAH,
ainda em criança, deve ser encorajado até por uma questão de prevenção para a
eventual futura dependência química.
A dependência a anfetaminas, cocaína e seus derivados (craque) leva
a um quadro francamente psicótico, paranóico e alucinatório. Como não se trata
de uma esquizofrenia franca ou genuína, falamos em quadro esquizofreniforme.
Apesar de muito exuberante em sintomas, tudo isso se resolve em poucas semanas
com a abstinência e o tratamento da dependência. Por outro lado, embora a
esquizofrenia verdadeira não seja causada pelas drogas, poderá ser severamente
piorada com o uso de destas, formando assim um círculo vicioso; esquizofrenia –
drogas - piora da esquizofrenia – mais drogas... e assim por diante. Nesses
pacientes o controle dos sintomas psicóticos é de grande importância para a
redução na utilização da droga.
O
Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TSPT),
também tem forte relação com o uso de drogas, tanto de cocaína quanto de
maconha. Trabalho policial, violência urbana, guerras, acidentes e outros
eventos traumáticos favorecem o TSPT e, conseqüentemente o uso de drogas (Brady,
2000).
O Transtorno de Pânico é outro quadro que também representa
um risco aumentado para o uso abusivo de substância, notadamente do álcool.
Estudo de McCrady (1999) mostrou uma prevalência de uso abusivo de
drogas em 16% da população com Transtorno do Pânico.
É muito importante avaliar a presença de comorbidades nos pacientes
com dependência química para maior eficácia do tratamento. Além de proporcionar
o não-uso da substância, o tratamento objetiva assistir intensivamente a
eventual síndrome de abstinência, a correção de estados agudos de ansiedade e depressão,
idéias delirantes e eventuais alucinações.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
MCCRADY,
BS.; EPSTEIN, EE. Addictions: A Comprehensive Guidebook. New
York, Oxford University Press, 1999.
BRADY,
KT E COLS. Comorbidity of Psychiatric Disorders and Posttraumatic
Stress Disorder. J Clin Psychiatry; 61 (suppl 7), 2000.
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S. E COLS. Correlates of Substance Misuse in Patients with
First-Episode Schizophrenia and Schizoaffective Disorder. Acta Psychiatr
Scand; 104: 365-374, 2001.
BERATIS,
S.; KATRIVANOU, A.; GOURZIS, P. Factors Affecting Smoking in
Schizophrenia. Comprehensive Psychiatry; 42: 393-402, 2001.
GLANTZ,
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Development and Psychophatology; 12: 795-814, 2000.
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Longitudinal Course of Substance Abuse Among People with Severe Mental I11ness.
Community Mental Health Journal; 36: 557-569, 2000.
MOREIRA,
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esquizofrenia: etiologia e tratamento J.Bras.Psiquiatr. 52 (4): 245-330,
2003.
CO-DEPENDÊNCIA QUÍMICA
Intrigante
e até misteriosa, é a aparente perseverança com que alguns familiares,
normalmente cônjuges e companheiros(as), se dedicam aos parentes com problemas
de dependência, alcoolismo, jogo patológico ou outro transtorno grave da
personalidade. Difícil entender como e porque essas pessoas suportam
heroicamente todo tipo de comportamento problemático, ou até atitudes
sociopáticas dos companheiros(as), como se assumissem uma espécie de desígnio
ou “carma”, para o qual fossem condenados para todo o sempre.
Não
se consegue compreender porque essas pessoas abrem mão da possibilidade de ser
feliz ou de diminuir o sofrimento, permanecendo atreladas à pessoa
problemática, suportando toda a tirania de sua anormalidade, como se esse fosse
o único papel reservado pelo destino.
Os
profissionais com prática no exercício da clínica psiquiátrica sabem das
dificuldades existenciais dessas pessoas codependentes, ou seja, “dependentes”
dos companheiros(as) problemáticos, quando estes deixam o vício. Parece que os
codependentes ficaram órfãos, de uma hora para outra, perdidos e sem propósito
de vida. Não é raro que passem elas, as pessoas codependentes, a apresentar
problemas semelhantes àqueles dos antigos dependentes que cuidavam.
Codependência
é um transtorno emocional definido e conceituado por volta das décadas de 70 e
80, relacionada aos familiares dos dependentes químicos, e atualmente estendido
também aos casos de alcoolismo, de jogo patológico e outros problemas sérios da
personalidade.
Codependentes
são esses familiares, normalmente cônjuge ou companheira(o), que vivem em
função da pessoa problemática, fazendo desta tutela obsessiva a razão de suas
vidas, sentindo-se úteis e com objetivos apenas quando estão diante do
dependente e de seus problemas. São pessoas que têm baixa auto-estima, intenso
sentimento de culpa e não conseguem se desvencilhar da pessoa dependente.
O
que parece ficar claro é que os codependentes vivem tentando ajudar a outra
pessoa, esquecendo, na maior parte do tempo, de cuidar de sua própria vida,
auto-anulando sua própria pessoa em função do outro e dos comportamentos
insanos desse outro. Essa atitude patológica costuma acometer mães (e pais),
esposas (e maridos) e namoradas(os) de alcoolistas, dependentes químicos,
jogadores compulsivos, alguns sociopatas, sexuais compulsivos, etc.
O
CODEPENDENTE É ATADO NA PESSOA PROBLEMA
Uma
expressão que representa bem a maneira como o codependente adere à pessoa
problemática é atadura emocional. Dizemos que existe atadura
emocional quando uma pessoa se encontra atrelada emocionalmente a coisas
negativas ou patológicas de alguém que o rodeia; seja esposo, filho, parente,
companheiro de trabalho, etc. Devida a essas amarras emocionais o codependente
passa a ser quase um outro dependente (da pessoa problemática).
A
Codependência se manifesta de duas maneiras: como um
intrometimento em todas as coisas da pessoa problema, incluindo horário de
tomar banho, alimentação, vestuário, enfim, tudo o que diz respeito à vida do
outro. Em segundo, tomando para si as responsabilidades do outra pessoa.
Evidentemente, ambas atitudes propiciam um comportamento mais irresponsável
ainda por parte da pessoa problemática.
Percebe-se
na codependência um conjunto de padrões de conduta e pensamentos (patológicos)
que, além compulsivos, produzem sofrimento. O codependente almeja ser,
realmente, o salvador, protetor ou consertador da outra pessoa,
mesmo que para isso ele esteja comprovadamente prejudicando e agravando o
problema do outro.
Como
se nota, o problema do codependente é muito mais dele próprio do que da pessoa
problemática e, normalmente, a nobre função do codependente depende da
capacidade de ajudar ou salvar a outra pessoa, que sempre é transformada
em vítima e não responsável pelos próprios problemas.
Por
causa do envolvimento de toda a família nos problemas do dependente ou
alcoolista, considera-se que o alcoolismo ou o uso nocivo de drogas é uma
doença que afeta não apenas o dependente, mas também a família.
SINTOMAS DA CODEPENDÊNCIA
A
Codependência é uma condição específica que se caracteriza por
uma preocupação e uma dependência excessivas (emocional, social e a vezes
física), de uma pessoa em relação à outra, reconhecidamente problemática.
Depender tanto assim de outra pessoa se converte em uma condição patológica que
caracteriza o codependente, comprometendo suas relações com as demais pessoas.
Em pouco tempo o codependente começa a achar que ninguém apóia a pessoa
problema (como ele), que ambos são incompreendidos, ele e a pessoa
problemática, ambos não recebem o apoio merecido, etc.
O
Codependente tem seu próprio estilo de vida e seu modo de se
relacionar consigo próprio, com os demais e com a pessoa problemática. Devido
sua baixa auto-estima, ele sempre se preocupa mais com os outros do que consigo
mesmo (pelo menos aparentemente).
A
pessoa codependente não sabe se divertir normalmente porque leva a vida
demasiadamente a sério, parecendo haver um certo orgulho em carregar tamanha
cruz, em suportar as ofensas, humilhações e frustrações. Como ele precisa
desesperadamente da aprovação dos demais, porque no fundo ele mesmo sabe que
está exagerando em seus cuidados com a pessoa problemática, procura ter
complacência e compreensão com todos por uma simples questão de reciprocidade
(quer que os outros também entendam o que está fazendo).
A
Codependência se caracteriza por uma série de sintomas e
atitudes mais ou menos teatrais, e cheias de Mecanismos de Defesa,
tais como:
1. - Dificuldade para
estabelecer e manter relações íntimas sadias e normais, sem que grude muito ou
dependa muito do outro;
2. - Congelamento
emocional. Mesmo diante dos absurdos cometidos pela pessoa problemática o
codependente mantém-se com a serenidade própria dos mártires;
3. - Perfeccionismo. Da
boca para fora, ou seja, ele professa um perfeccionismo que, na realidade ele
queria que a pessoa problemática tivesse;
4. - Necessidade obsessiva
de controlar a conduta de outros. Palpites, recomendações, preocupações,
gentilezas quase exageradas fazem com que o codependente esteja sempre super
solícito com quase todos (assim ele justificaria que sua solicitude não é apenas
com a pessoa problemática);
5. - Condutas
pseudo-compulsivas. Se o codependente paga as dívidas da pessoa problemática
ele “nunca sabe bem porque fez isso”, diz que não consegue se controlar;
6. – Sentir-se responsável
pelas condutas de outros. Na realidade ele se sente mesmo responsável pela
conduta da pessoa problemática, mas para que isso não motive críticas, ele
aparenta ser responsável também pela conduta dos outros;
7. - Profundos sentimentos
de incapacidade. Nunca tudo aquilo que fez ou está fazendo pela pessoa problemática
parece ser satisfatório;
8. – Constante sentimento
de vergonha, como se a conduta extremamente inadequada da pessoa problemática
fosse, de fato, sua;
9. – Baixa autoestima;
10. - Dependência da
aprovação externa, até por uma questão da própria auto-estima;
11. - Dores de cabeça e
das costas crônicas que aparecem como somatização da ansiedade;
12. - Gastrite e diarréia
crônicas, como envolvimento psicossomático da angústia e conflito;
13. - Depressão. Resultado
final.
Parece
um nobre empenho ajudar a outras pessoas que se estão se autodestruindo, como
no caso dos alcoolistas ou dependentes químicos, do jogo ou do sexo
compulsivos. Entretanto, se quem ajuda se esquece de si mesmo, se entrega à
vida da outra pessoa problemática, então estamos diante da Codependência.
A dor na Codependência é maior que o amor que se recebe e se
uma relação humana resulta prejudicial para a saúde física, moral ou
espiritual, ela deve ser desencorajada.
Na
realidade a codependência é uma espécie de falso-amor, uma vez que parece ser
destrutivo, tendo em vista que pode agravar o problema em questão, seja a
dependência química, alcoolismo, transtornos de personalidade, etc. Todo amor
que não produz paz, mas sim angústia ou culpa, está contaminado de
codependência, é um amor patológico, obsessivo é bastante destrutivo. Ao não
produzir paz interior nem crescimento espiritual, a codependência cria
amargura, angustia e culpa, obviamente, ela não leva à felicidade. Então, vendo
desse jeito, a codependência aparenta ser amor, mas é egoísmo, medo da perda de
controle, da perda da relação em si.
DISFUNÇÃO FAMILIAR
Na
família da pessoa problemática as relações familiares e a comunicação interpessoal
vão se tornando cada vez mais complicadas. A comunicação se faz mais confusa e
indireta, de modo que é mais fácil encobrir e justificar a conduta do
dependente do que discuti-la. Esta dificuldade (disfunção) vai se convertendo
em estilo de vida familiar e produzindo, em muitos casos, o isolamento da
família dos contatos sociais cotidianos. As regras familiares se tornam
confusas, rígidas e injustas para seus membros, de forma que os deveres passam
a ser distorcidos, com algum prejuízo das pessoas que não têm problemas e
privilégios da pessoa problemática.
Como
se vê, a conduta codependente é uma resposta doentia ao comportamento da pessoa
problemática, e se converte em um fator chave na evolução da dependência, isto
é, a codependência promove o agravamento da situação da pessoa problemática,
processo chamado de facilitação. Mas, os codependentes não se dão conta de que
estão facilitando o agravamento do problema, em parte pela negação e em parte
porque estão convencidos de que sua conduta esta justificada, uma vez que estão
“ajudando” o dependente a não se deteriorar ainda mais e que a família
não se desintegre.
Costuma
ser mais freqüente do que se pensa, as pessoas codependentes buscarem ajuda
médica, porém, sem que tenham crítica de tratar-se de codependência. Antes
disso, essas pessoas se queixam de depressão ou simplesmente de estresse.
Os
profissionais de saúde que trabalham na área de dependências, correm sempre o
risco de desenvolver codependência como resultado da exposição crônica à dependência
dos pacientes.
As
manifestações dessa codependência profissional são muito variadas, podendo
dizer respeito à assumir franca e pesada responsabilidade pelo dependente,
protege-lo das conseqüências de suas decisões, e dar-lhe sermões repetitivos, enfim,
assumir atitudes que ultrapassam as funções do profissional.
Quando
acontece a codependência em profissionais da área (médicos, psicólogos,
terapeutas ocupacionais, pessoal da enfermagem), normalmente não há uma crítica
imediata da situação, senão a sensação de que todas as atitudes objetivam
genuinamente ajudar o paciente. Entretanto, a codependência está longe de
ajudar, sendo mais provável um agravamento da dependência ou uma facilitação.
O
impacto que a família sofre com o uso de drogas por um de seus membros é
correspondente as reações que vão ocorrendo com o sujeito que a utiliza. Este
impacto pode ser descrito através de quatro estágios pelos quais a família
progressivamente passa sob a influência das drogas e álcool:
1. Na primeira etapa, é preponderantemente
o Mecanismo de Negação. Ocorre tensão e
desentendimento e as pessoas deixam de falar sobre o que realmente pensam e
sentem;
2. Em um segundo momento,
a família demonstra muita preocupação com essa questão, tentando controlar o
uso da droga, bem como as suas conseqüências físicas, emocionais, no campo do
trabalho e no convívio social. Mentiras e
cumplicidades relativas ao uso abusivo de álcool e drogas instauram um clima de segredo
familiar. A regra é não falar do assunto, mantendo a ilusão de que as drogas e
álcool não estão causando problemas na família;
3. Na terceira fase, a desorganização da família é enorme. Seus
membros assumem papéis rígidos e previsíveis, servindo de facilitadores. As
famílias assumem responsabilidades de atos que não são seus, e assim o
dependente químico perde a oportunidade de perceber as conseqüências do abuso
de álcool e drogas. ? comum ocorrer uma inversão de papéis e funções, como por
exemplo, a esposa que passa a assumir todas as responsabilidades de casa em
decorrência o alcoolismo do marido, ou a filha mais velha que passa a cuidar
dos irmãos em conseqüência do uso de drogas da mãe.
4. O quarto estágio é
caracterizado pela exaustão emocional, podendo surgir graves
distúrbios de comportamento e de saúde em todos os membros. A situação fica
insustentável, levando ao afastamento entre os membros gerando desestruturação
familiar
RECUPERAÇÃO
DA CODEPENDÊNCIA
A
Codependência também pode ser agravante e desencadeante de
depressão, suicídio, doenças psicossomáticas, e outros transtornos. Os grupos
de ajuda para familiares de dependentes (químicos e alcoólicos) visam,
principalmente, reverter este quadro, orientando os familiares a adotarem
comportamentos mais saudáveis. Os profissionais acham que o primeiro passo em
direção a esta mudança é tomar consciência e aceitar o problema.
O
tratamento da Codependência pode consistir de psicoterapia,
grupos de auto ajuda, terapia familiar e em alguns casos, antidepressivos e
ansiolíticos. Os grupos de auto ajuda para familiares de dependentes, tais
como, Alanom e Codependentes Anônimos são de grande utilidade
no processo de recuperação familiar da codependência.
CODEPENDENTES
ANÔNIMOS
Nos
mesmos moldes dos Alcoólicos Anônimos, Codependentes Anônimos
são grupos de ajuda com metodologia de relato em grupo e do estímulo para
observância de algumas recomendações disciplinares e de alguns passos
importantes. As chamadas Doze Tradições dos Codependentes Anônimos
foram adaptados das 12 Tradições de Alcoólicos Anônimos conforme
abaixo:
1- Nosso bem-estar comum
deve estar sempre em primeiro lugar; a recuperação pessoal depende da unidade
de Codependentes Anônimos;
2- Somente uma autoridade
preside, em última análise, ao nosso propósito comum – um Poder Superior
amantíssimo que Se manifesta em nossa consciência coletiva. Nossos líderes são
apenas servidores de confiança; não têm poderes para governar;
3- O único requisito para
ser membro da unidade de Codependentes Anônimos é ter um sincero desejo para
relacionamentos saudáveis e amorosos;
4- Cada Grupo deve ser
autônomo, salvo em assuntos que afetam outros Grupos, ou Codependentes Anônimos
como um todo;
5- Cada Grupo tem um único
propósito primordial – levar sua mensagem ao Codependente que ainda sofre;
6- Um Grupo de
Codependentes Anônimos nunca deverá jamais endossar, financiar ou emprestar o
nome de Codependentes Anônimos a qualquer sociedade parecida ou empreendimento
alheio à irmandade, para que problemas de dinheiro, propriedade e prestígio não
nos desviem de nosso propósito espiritual;
7- Cada Grupo deverá ser
totalmente auto-sustentável, recusando assim contribuições de fora;
8- Codependentes Anônimos
deverá permanecer sempre não profissional, embora nossos centros de serviços
possam empregar trabalhadores especializados;
9- Codependentes Anônimos,
jamais deverá organizar-se como tal; podemos, porém, criar juntas ou comitês de
serviço diretamente responsáveis perante aqueles a quem prestam serviços;
10- Codependentes Anônimos
não opinam sobre questões alheia à Irmandade, portanto, o nome de Codependentes
Anônimos, jamais deverá aparecer em controvérsias públicas;
11- Nossas relações com o
público baseiam-se na atração em vez da promoção; cabe-nos sempre preservar o
anonimato pessoal em nível de imprensa, rádio e filmes;
12- O anonimato é a base
espiritual de todas as nossas Tradições, lembrando-nos sempre da necessidade de
colocar os princípios acima das personalidades.
Vejamos
agora os Doze Passos de Alcoólicos Anônimos, dos quais surgiu a
adaptação dos 12 Passos de Codependentes Anônimos:
1- Admitimos que éramos
impotentes perante os outros - que nossas vidas haviam se tornado
incontroláveis;
2- Viemos a acreditar que
um Poder Superior a nós, poderia nos devolver a sanidade;
3- Decidimos entregar
nossa vontade e nossa vida aos cuidado de Deus como nós O concebíamos;
4- Fizemos um destemido e
minucioso inventário moral de nós mesmos.
5- Admitimos perante a Deus, perante nós mesmos e perante outro ser humano, a natureza exata de nossas falhas;
5- Admitimos perante a Deus, perante nós mesmos e perante outro ser humano, a natureza exata de nossas falhas;
6- Prontificamo-nos
inteiramente a deixar que Deus removesse todos esses defeitos de caráter;
7- Humildemente rogamos a
Deus para que nos livrasse de nossas imperfeições;
8- Fizemos uma relação de
todas as pessoas a quem tínhamos prejudicado e nos dispusemos a reparar os
danos a elas causados;
9- Fizemos reparações
diretas dos danos causados a tais pessoas, sempre que possível, exceto quando
fazê-lo significasse prejudicá-las ou a outrem. 10- Continuamos fazendo o
inventário pessoal, e quando nós estávamos errados, nós o admitíamos
prontamente;
11- Procuramos através da
prece e da meditação melhorar nosso contato consciente com Deus como nós O
concebíamos, rogando apenas o conhecimento de Sua vontade em relação a nós e
força para realizar essa vontade;
12- Tendo experimentado um
despertar espiritual, graças a estes Passos, procuramos levar esta mensagem
para outros codependentes e praticar estes princípios em todos as nossas
atividades;
A
American Society of Addiction Medicine propõe três fases para o
tratamento de famílias de dependentes químicos, sendo que o nível de
intervenção varia de acordo com a meta de tratamento estabelecida, bem como as
necessidades da família. A tabela abaixo sumariza os níveis de intervenção
familiar de acordo com as fases:
Fase I:
- 1. Trabalhar a negação;
- 2. Interromper o consumo de substâncias
- 1. Trabalhar a negação;
- 2. Interromper o consumo de substâncias
Fase II:
- 1. Prevenir recaídas;
- 2. Estabilizar a família, melhorando seu funcionamento.
- 1. Prevenir recaídas;
- 2. Estabilizar a família, melhorando seu funcionamento.
Fase III:
- 1. Aumentar a intimidade do casal, no plano emocional e sexual.
- 1. Aumentar a intimidade do casal, no plano emocional e sexual.
Segundo
a psicóloga Neliana Buzi Figlie, especialista em dependência
química, a Fase I objetiva que o dependente a atinja a
abstinência. Para tal é importante auxiliar as pessoas a assumir a
responsabilidade sobre seus comportamentos e sentimentos. Por vezes, alguns
membros podem ser atendidos conjuntamente, enfatizando a diminuição da
reatividade do impacto de um familiar nos outros. Ao pensar no modelo de
doença, nesta fase é trabalhado o conceito de Codependência.
No
referencial sistêmico, o foco centra-se na esposa definir uma posição de modo a
quebrar o circulo repetitivo do funcionamento familiar e desta forma, auxiliar
o dependente em sua recuperação. O referencial comportamental trabalha com a
perspectiva de visualizar comportamentos do cônjuge que reforcem o
comportamento aditivo, almejando a substituição por comportamentos que reforcem
a sobriedade.
Na
Fase II, ainda segundo Neliana Buzi Figlie, o foco é
identificar padrões disfuncionais na família como um todo, tanto na família de
origem, quanto da família de procriação. Nesta fase é importante retomar
rituais familiares e conforme o grau de dificuldade, o encaminhamento para uma
psicoterapia familiar especializada pode ser realizado.
A
Fase III é definida como uma nova fronteira no tratamento da
dependência química, sendo uma das áreas menos exploradas e talvez uma das mais
controversas. Muito tempo após a cessação do consumo de substâncias, alguns
relacionamentos continuam desgastados. Nesta fase o tratamento tem como meta
aumentar a intimidade do casal e a participação de ambos no processo é
fundamental.
Em
termos de modalidades de tratamentos psicológicos, Neliana Buzi Figlie
discorre sobre 4 tipos:
Grupos de Pares, onde os membros da
família são distribuídos em diferentes grupos dependentes químicos, pais, mães,
irmãos, cônjuges, etc. A interação entre pares é facilitadora de mudanças, uma
vez que escutar de um par não é o mesmo que escutar de um profissional, porque
o par passa por situação semelhante e não é alvo de fantasias e idealizações
como o terapeuta.
Grupos de Multifamiliares. Através de um encontro de
famílias que compartilham da mesma problemática, cria-se um novo espaço
terapêutico que permite um rico intercâmbio a partir da solidariedade e ajuda
mútua, onde as famílias se convocam para ajudar a solucionar o problema de uma
e de todas, gerando um efeito em rede. Todas as famílias são participantes e
destinatárias de ajuda.
Psicoterapia de Casal, onde os casais podem ser
atendidos individualmente ou também em grupos, uma vez que o profissional tenha
habilidades para conduzir as sessões sem expor particularidades que não sejam
adequadas ao tema focado.
Psicoterapia Familiar. Aqui a é a abordagem
mais especializada segundo um referencial teórico de escolha do profissional
para a compreensão do padrão familiar e intervenção. Nesta modalidade se reúne
a família e o dependente químico.
Fonte: http://www.psiqweb.med.br/site/?area=NO/LerNoticia&idNoticia=24.
Acessado em 22/01/13 às 23:26hs.
Excelente conteúdo.
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